quarta-feira, 13 de novembro de 2013

A Ética se perdeu entre 32 milhões de prostituídos e 32 milhões de miseráveis

Assistimos surpresos ao limiar de um mundo virtual, em cada dia os limites entre a realidade e o simulacro ficam mais invisíveis. Os meios de comunicação reforçam essa idéia, na capa de jornais e revistas, o real aos poucos vai perdendo espaço. Outdoors da revista Veja espalhados por toda cidade, de um lado a foto da revista que tem como chamariz personagens da novela “Laços de família”, do outro, em letras pretas sobre um fundo amarelo vem a “chamada”_ 32 milhões de brasileiros fazem que nem a Capitu: já tem programa para a noite. Capitu é um personagem da novela. Garota de programa, mãe solteira, moradora do Leblon. Dramaticamente se prostitui para criar o filho dentro de um padrão de vida de classe média alta do Rio de Janeiro. Essa chamada traz uma certa ambigüidade, seriam 32 milhões de brasileiros se prostituindo em frente à TV? Consumindo bens simbólicos através de uma velha fórmula que apela para o sentimentalismo, para o erotismo, violência e medo e, por fim, todos torcendo por um final feliz. O absurdo, talvez, não esteja aí, mas na forma como os meios de comunicação estão articulados dando suma importância aos acontecimentos da novela, que ganham um volume maior do que o real. Um jornalismo absolutamente comprometido com a chamada indústria cultural que segundo a jornalista E. criou uma nova face do jornalismo: “A indústria cultural produz outro tipo de pauta. Uma novidade reforçada nos anos 90, a presença das acessorias de comunicação pautando os jornais, você manda informações bem costuradas, releases, fazendo um bom gancho em cima daquela história e eles compram.” Nesse sentido a informação se torna cada vez mais um produto e o jornalista de certa forma um fabricante que tem seu produto embalado pelo marketing e exposto nas vitrines televisivas e impressas. O controle da informação acaba também transformando pessoas em produtos, “Muitas matérias são construídas pelas acessorias de imprensa, pelos promoters. Por exemplo, um cantor muito michuruca, de repente, o jornalista inventa que o sujeito ficou pelado na avenida Atlântica e o cara o vira uma assumidade. O silicone de fulaninha de tal... Outra coisa, ela inventa produtos que não têm a menor importância, a cultura virou produto, qualquer coisa, qualquer porcaria que esteja acontecendo vira uma grande matéria. Qualquer Zé Mané pode virar uma pessoa super importante se tiver uma boa acessoria por trás dele, anunciantes também.”, explica E. A publicidade já é parte orgânica de jornais e revistas e não apenas parte de sua estratégia de venda. Milhões de brasileiros acompanharam o drama de Camila, também personagem da novela “Laços de família” ao raspar o cabelo diante das câmeras antes de iniciar o tratamento contra a leucemia. No dia seguinte o drama da personagem era matéria de capa de jornais e revistas, o simulacro ocupando o lugar da realidade. Para a jornalista E. essa é uma das faces mais bizarras do atual jornalismo, “ Isso é um verdadeiro desastre, uma história que acontece na novela de televisão ser primeira página de jornal, ganhando a mesma proporção, o mesmo nível de importância que a vida real. Quer dizer, o real e o simulacro disputando o mesmo espaço. O simulacro tomou o peso do real, o mesmo peso, a mesma medida. Tem muita coisa boa acontecendo, mas o grande problema que eu acho é essa banalização da vida, botar tudo no mesmo plano, uma novela e a vida real, coisas super importantes ficam no espaço de uma notinha, minimizada. A valorização deles é questionável.” O jornalismo é questionável em vez de ser o questionador, a informação vira deformação, a publicidade torna-se parte construtora da notícia. Trinta e dois milhões de pessoas em frente à TV assistem a novela das oito. O mesmo número de pessoas que vivem em condições de miséria no país, que não ocupam um lugar em frente à TV e muito menos dentro dela, não são notícia. A ética jornalística parece ter se perdido em algum lugar entre esses 32 milhões de prostituídos e os 32 milhões de miseráveis. Tudo encarado com a maior naturalidade. Laços de Família é uma telenovela brasileira produzida e exibida pela Rede Globo no horário das 20 horas, de 5 de junho de 2000 a 2 de fevereiro de 2001, em 209 capítulos.

SONHO...

Finalmente durmo. Uma salamandra escala uma abóbada dourada. Sob a abóbada um chimpanzé dá aulas de ortografia. A palavra não é mais humana. Uma banana, vestida de cigana, dança. Sobre seu chapéu está Carmem Miranda. Nada sustenta a abóbada, feito um disco voador ela flutua. Tímidos, Sol e Lua se encontram, não há eclipse. O tempo do Sonho é o tempo da contemplação. De repente surgem um tigre e uma águia que me conduzem por caminhos que eu mesmo criei. Vamos ao topo de um desfiladeiro, sua base encontra-se à centenas de metros abaixo de nós. Lá embaixo um mar dourado, tal qual a abóbada. Olho a minha frente, três pontos vermelhos se aproximando. Não são pontos, são três cavalos de veludo vermelho. Eles conversam com o tigre. Ele me convida a voar. Salto do desfiladeiro. A águia e a água me aguardam. Em um vôo rasante toco a água. Águas diáfanas que tentam esconder nuvens, não há peixes, somente camelos coloridos nadando. Algo mais aparece, uma grande embarcação cheia de crianças e lobos. Seu movimento é suave apesar de seu tamanho. As crianças olham para mim e sorriem, os lobos também. Foi a primeira vez que vi lobos sorrindo. Um som forte... Acordo.